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Sobre a “Carta dos Direitos da Internet”

Este documento introduz o conceito de uma 'Carta dos Direitos da Internet', uma breve discussão do porquê de sua existência e alguns diferentes pontos de vista no tema.

Contribuição ao Forum de Governança da Internet (IGF) das Nações Unidas

Vittorio Bertola
31 de Julho de 2006

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questionário para formulação
da ‘Carta dos Direitos da Internet’

1) Introdução

Este documento introduz o conceito de uma “Carta dos Direitos da Internet”, uma breve discussão do porque de sua existência, e alguns diferentes pontos de vista no tema.

2) Visão geral e histórico do conceito

Desde a criação da Internet, pessoas e organizações que passam a fazer uso da rede percebem sua capacidade de operar profundas transformações em todos os setores da sociedade: economia, política, cultura, mídia, relações interpessoais, hobbies, empregos… tudo está sendo influenciado pelas mudanças promovidas pelo uso da Internet e pelo advento da Sociedade da Informação.

Portanto, logo evidenciou-se que os direitos e deveres tradicionais dos indivíduos seriam afetados e reformatados em função desta nova realidade. Alguns direitos tradicionais, como privacidade, tornaram-se centrais para o novo ambiente. De um momento para o outro, transações e interações internacionais tornaram-se parte do dia-a-dia de todos, trazendo problemas conceituais às definições de soberania e jurisdição. Novas questões conceituais tais como acesso e compartilhamento do conhecimento e neutralidade da rede (network neutrality) surgiram como consequência de novas possibilidades tecnológicas e modelos sócio-econômicos viabilizados pela Internet.

Ao debater os temas específicos, mais e mais pessoas começaram a perceber que seria necessária uma abordagem holistica no nível de princípios e conceitos, de forma a consensuar diretrizes para a implementação dos direitos e deveres tradicionais no novo ambiente, e, se necessário, estabelecer outros novos.

Consensuar princípios e conceitos a nível global é obviamente um processo difícil e doloroso, mas a globalidade intrínseca da Internet não nos deixa escolha. Se não estabelecermos fundamentos comuns para o desenvolvimento justo, distribuído e democrático da Internet, o resultado será um desenvolvimento injusto e autoritário, determinado por interesses de poucos grupos e países poderosos. Estes são os motivos pelos quais foi concebida a “Carta dos Direitos da Internet”: um documento construído sobre os princípios da internacionalmente consensuada declaração dos direitos humanos, que poderia definir como estes direitos serão aplicados na Internet e na Sociedade da Informação global, e também como expandi-los quando necessário para lidar com as novas situações.

Entretanto, mesmo havendo amplo consenso sobre a utilidade de tal documento, ainda não existe um esforço comum para realizá-lo. É necessário fomentar o debate para se alcançar acordo sobre as diferentes visões em termos de escopo e conteúdo, e também sobre como desenvolvê-lo de maneira aberta e inclusiva.

3) Algumas iniciativas anteriores

No passado, alguns esforços foram mobilizados para a concepção de minutas e princípios norteadores por diferentes grupos de atores e de diversas formas. Sem pretensões de apresentar uma lista completa das iniciativas, esta seção apresenta brevemente quatro de tais mobilizações com o objetivo de ilustrar a diversidade de abordagens.

a) Forum Internet

“Forum Internet” (http://www.foruminternet.org/) é uma iniciativa promovida pelo governo francês que tem como objetivo criar um espaço aberto para discussão dos direitos e deveres dos usários da Internet. Como descrito no website:

“A idéia de criar um organismo específico para refletir sobre as questões legais levantadas pela Internet surgiu inicialmente na França no relatório de 1998 do Conselho de Estado Francês — a suprema autoridade legal e administrativa do governo — “A Internet e as redes digitais”. O então primeiro ministro francês designou o membro do parlamento Christian Paul como responsável por levar adiante a reflexão, o que resultou em um relatório de julho de 2000 intitulado “Sobre direitos e liberdades na Internet”; o texto confirmou a relevância da idéia e utilizou o termo “Forum” pela primeira vez.

O primeiro ministro francês Lionel Jospin então decidiu iniciar o projeto do Forum de Direitos da Internet em dezembro de 2000 e designou a Sra. Isabelle Falque-Pierrotin, membro do Conselho de Estado, como coordenadora da iniciativa. Como resultado de uma reflexão coletiva que leva em conta a interdependência dos setores público e privado na web e a rápida evolução das modernas tecnologias, o Forum é uma área permanente de diálogo e reflexão que objetiva o desenvolvimento de regras e usos que possam harmonizar a convivência neste novo espaço. Trata-se de parte de um projeto de co-regulação da Internet no qual a auto-regulação do setor privado e as regulações das inúmeras instituições públicas poderiam coexistir.”

O Forum publicou uma série de diferentes cartas, definindo direitos e deveres dos usuários da Internet em campos específicos; por exemplo, uma declaração de direitos e deveres de administradores de foruns de discussão baseados na web.

b) A Declaração de Independência do Ciberespaço

Um iniciativa bem diferente é a “Declaração da Independência do Ciberespaço”, de John Perry Barlow, fundador da Electronic Frontier Foundation, publicada no Forum Economico Mundial de Davos em 1996. Foi um esforço individual e não coletivo, resultado da reflexão solitária de um pensador emergindo nos anos de pioneirismo da Internet nos Estados Unidos. O texto reflete um ponto de vista forte e específico, focando do direito de “independência” da Internet em relação às regulações tradicionais, promovidas por governos. Continua sendo considerado um dos mais famosos e influentes documentos da história da Internet.

A declaração pode ser encontrada aqui: http://homes.eff.org/~barlow/Declaration-Final.html.

c) Carta de Direitos de Comunicação da APC

A ‘Association for Progressive Communications‘ (APC) é uma das mais conhecidas e respeitadas ONGs operando no setor dos direitos de comunicação e desenvolvimento, envolvendo um grande número de indivíduos e organizações locais em todo o mundo.

Em 2001 foi concebida uma carta que incluiu a definição de direitos e princípios em sete amplas áreas ligadas à comunicação: o direito de comunicar, liberdade de expressão, diversidade e controle de conteúdo, software livre e direitos de propriedade intelectual, privacidade, governança da Internet, e percepção e aplicação destes direitos. Como declarado na carta, “Os temas e princípios descritos expressam as perspectivas e objetivos de nossa comunidade em relação ao direito de pessoas e organizações em utilizar a Internet livremente, particularmente em atividades ligadas à justiça social, econômica e ambiental. Referimo-nos especificamente à Internet, entretanto, tais princípios são relevantes para todas as demais tecnologias de comunicação (incluindo telefone, rádio e outras).”

A íntegra da carta por ser encontrada aqui: http://rights.apc.org/charter.shtml.

d) A campanha “Tunis Meu Amor”

A campanha “Tunis Meu Amor” foi iniciada em 2005 por Fiorello Cortiana, membro do parlamento italiano, antecipando a segunda fase da Cúpula Mundial da Sociedade da Informação, para apoar a proposta de definição de uma “Carta dos Direitos da Internet” ao nível da ONU. A iniciativa imediatamente recebeu apoio de personalidade de todos os outros grupos de atores no processo, incluíndo o Ministro da Cultura brasileiro, Gilberto Gil, o fundador do movimento do software livre, Richard Stallman, e o fundador do movimento Creative Commons, professor Lawrence Lessig.

A campanha concentrou esforços em solicitar à Cúpula de Tunis a adoção da idéia de forma a originar o processo para sua realização; uma oficina no tema foi realizada em Tunis, e o trabalho foi documentado no website: http://www.tunismonamour.org/


4) Conclusões

Como discutido acima, muitas iniciativas foram mobilizadas com o objetivo de definir direitos e deveres de usuários individuais da Internet. Trata-se de uma prova da real necessidade de tal documento, e também demonstra o risco de muitas atividades fragmentadas concorrentes entre si. No contexto mais amplo do acompanhamento da Cúpula em Tunis, que em si foi um esforço de alcançar acordo sobre princípios globais para um desenvolvimento ordenado da Sociedade da Informação, deveria haver uma forma de reunir todos os atores interessados e minutar um único e amplamente apoiado documento que poderia ser utilizado como base para outras atividades.

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